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Vazio?

A primeira vez que vi L’eclisse (1962), de Michelangelo Antonioni, vi em italiano, uma língua que não domino. Primeiro achei que não fizesse sentido ver um filme sem perceber o que as personagens diziam, mas o filme despertou o meu interesse,logo a partir do início, por não estar habituada a ver aquele tipo de montagem em cinema. Lento, mostrando vários momentos, havendo silêncio, entre outras coisas.

Foi muito engraçado para mim, porque quando vi o filme com legendas, percebi que a minha compreensão do mesmo, não tinha sido correcta (como era de adivinhar).

Porque voltei a ver o filme com legendas? E porque o vi até ao fim sem legendas?

Eu apreciei muito ver o filme, sem “compreensão linguística”, pois consegui penetrar nos cenários, de uma maneira extraordinária, e consegui contemplá-los, de uma maneira desinteressada, no sentido em que, não conseguia ter a localização espacial dos mesmos, e da acção exacta (diálogos).

Quando o vi com legendas, a experiência foi diferente, foi como se estivesse a conhecer um filme novo, em que consegui acompanhar a história, do seu modo ambíguo.

A sequência do filme que me marcou mais de todas as vezes que vi o filme, e sempre que me lembro dele, foi a parte em que a personagem corre atrás dos cães, de noite, e depois, se encontra sozinha.

Porquê esta sequência?

Esta sequência, foi a única que teve o mesmo efeito e significado para mim, quando vi e revi o filme. É uma sequência que me deixa sem palavras, sem adjectivos, consigo identificar-me com ela. Por isso mesmo a escolhi, embora o filme retrate um pouco a alienação em contraponto com a vontade de viver e sentir, esta cena mostra algo diferente.

A meu parecer, a personagem sente-se um pouco confusa, pois parece que se encontra num cenário completamente aleatório e estranho, como se a personagem não estivesse à espera de se encontrar ali, mas, ao mesmo tempo, parece que se conforta com algo daquele sítio.

É o momento em que ela se encontra sozinha, e parece estar em transição, pois o modo de estar da mesma, parece diferente da cena sozinha no fim e do início, pois, mesmo alienada de si mesma, de repente, tem um encontro com ela mesma.

Não sei se seria a intenção do realizador, mas foi a comunicação que chegou até mim. Todo o filme mostra espaços que nos dão a sensação de vazio, e as próprias personagens são vazias, sentem em algumas alturas, mas logo se seguida parecem vazias, tanto riem, como ficam vazias, quase como um vácuo (vazias não no sentido de fútil, mas próximo de alienação, como se faltasse algo na vida, algum sentido), contudo, naquele momento, mesmo estando presente o vazio, parece que há algo mais do que isso, como se a partir do vazio, algo fizesse sentido. Como se o meio envolvente lhe transmitisse algo, ou despertasse algo contido nela mesma.

Esta sequência, envolveu-me, foi quase como se eu estivesse lá a sentir essa mesma sensação, ao contrário do resto do filme, que embora seja envolvente, parece sempre distante. É isso mesmo, parece haver uma aproximação mais pessoal à personagem e ao filme.

Eu não consigo imaginar como será e foi ver este filme numa sala completamente escura, e com uma tela grande. Eu não imagino o que os espectadores na altura acharam e sentiram, ou não sentiram! Mas acho que se eu visse este filme nessas condições, esta sequência iria ainda ser mais “intensa” porque me iria envolver ainda mais. Acho que iria ser uma experiência única, e talvez, o vazio, também me fosse dizer alguma coisa.

Elenco:

Piero; Alain Delon

Vittoria; Monica Vitti

Riccardo; Francisco Rabal

Vittoria’s mother; Lilla Brignone

Créditos:

Director: Michelangelo Antonioni

História e guião: Michelangelo Antonioni e Tonino Guerra

Com colaboração de Elio Bartolini e Ottiero Ottieri

Produzido por: Robert Hakim and Raymond Hakim

Fotografia de: Gianni di Venanzo

Editado: Eraldo Da Roma

Música: Giovanni Fusco


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